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Especial autocuidado, parte 2

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Autocuidado vai além de um cabelo bem arrumado, as unhas feitas, terapia toda semana. “É algo rotineiro, que se materializa em um olhar com atenção para o que eu sinto, para a forma como eu vivo, o cuidado em me comunicar com o meu filho, com o externo. Como é que eu falo comigo? Como é que eu olho para mim?”, questiona Manoela Gonçalves (@soul.crioula), ativista e dona do Bistrô Manô, espaço de culinária no Butantã, em SP.
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Para chegar a essa definição, muita coisa aconteceu. Por cinco anos, Manoela manteve o projeto Casa das Crioulas, um espaço de acolhimento para mulheres periféricas. “Virou a chave da minha vida ter acolhido tantas mulheres. Cada dor e cada cura me transformaram na mulher que eu sou hoje”, diz, emocionada. “Entender o que leva uma mulher a agir da forma que age, mulheres que têm discurso machismo, preconceito, a abusada, a que abandonou o filho, a que matou. Mudou completamente o sentido da minha vida trabalhar com as dores das mulheres.”
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Ela achava que lidar diariamente com a dor a deixaria calejada. Estar na linha de frente, no entanto, doeu. “Tinha uma parte minha que tava completamente machucada, se identificava com as dores alheias e não saia desse ciclo de ficar curando ferida. Eu só queria cuidar. Demorou pra eu conseguir espaço pra mim mesma no meio de tanta pressão, carência, dor.” Demorou para ela criar uma linha imaginária em que só entra quem ela permite. “Aí começou um olhar mais amoroso. Sinto que estar em coletivo é muito bom, fortalecedor, mas é muito importante também o resgate da nossa força individual.”
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Hoje ela tem tomado cuidado ao ouvir histórias. “O que me motiva a não desistir é meu filho, é uma força absurda que tenho. Continuo lutando porque eu odeio injustiça, desigualdade, machismo. Mas também acolho e compreendo. O que me motiva é saber que eu tenho força pra inspirar, pra não desistir.”

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@comum.vc é uma plataforma de florescimento para mulheres. Em parceria com o @instamission, estamos fazendo a #jornadadeautocuidado. Já viu?
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Criadora da Comum, @annahaddad vive uma prática constante de #autocuidado. “Consigo às vezes, e às vezes não. Mas sinto que quando compreendemos essa noção mais ampla e profunda de autocuidado, que está estritamente relacionada à autocompaixão, aprendemos que nem sempre vamos conseguir de fato fazer o que entendemos que seria melhor para nós. Às vezes vamos ficar sem tempo, ser engolidas pelo caos, nos deixar sem cuidados básicos, seguir em relações que nos destroem, e precisamos nos acolher nisso também. O que não tem a ver com sermos condescendentes, autoindulgentes, e sim com nos acolhermos nos erros, nas dificuldades, nos nossos limites, ao invés de seguirmos nos culpando e chibatando.”
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O coletivo é fundamental nesse processo. “Faz muito mais sentido quando a gente se desenvolver sem perder a perspectiva do todo: somos mulheres, e nossas questões são muito individuais sim, mas são coletivas, fazem parte de um contexto de opressão sistêmica, que só vai mudar se tivermos consciência dele e nos movimentarmos.”
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Anna ouve histórias de abusos, abortos, relações abusivas, traumas, vícios e compulsões. “O que fica marcado é a resiliência dessas mulheres. A capacidade incrível que nós temos de viver as narrativas mais complicadas e tristes que alguém poderia viver, e conseguir buscar suporte, se abrir e se expor, encontrar caminhos em meio ao caos e atravessar aquela história. É quase heróico.”
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Empatia e compaixão são ingredientes fundamentais para que essas histórias não pesem. “Caroline Bertolino, psicóloga e especialista no tema da autocompaixão, diz muito isso: a medida de compaixão que temos conosco mesmas é a que vamos ter com os outros ao nosso redor. Se cuidamos da gente, provavelmente vamos ter mais energia e equilíbrio interno para cuidar dos outros. Está tudo interligado.”

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dandra

Passar a noite em casa lendo um livro, fazer terapia, se exercitar, comer bem, estar rodeada de pessoas que fazem bem, eliminar relações tóxicas e comportamentos nocivos de uma forma racional, por mais difícil que seja, e conseguir sinceridade em todas as relações. São esses os exercícios que @dandarademorais tenta praticar todos os dias. Essa pernambucana é atriz, diretora de cinema e ativista. Na correria, ela busca equilíbrio, pois sabe que, estando bem, consegue ajudar outras mulheres também.

E essas mulheres ela encontra, principalmente, na internet. “Acho que a internet tem um papel muito forte nessa era que estamos vivendo, porque deu voz a muitas pessoas. Essa conexão que a gente faz, todos os dias, por mais rápida que seja, é o que me move. São esses encontros que me estimulam e confirmam que estou defendendo pelos ideais certos. Poder contar com o coletivo é essencial. Tem momentos que realmente preciso de ajuda, digo de alguém pra me dar a mão, conversar e dizer que vai ficar tudo bem, que está ao meu lado. Na maioria das vezes quando falo sobre saúde mental, as pessoas não sabem o que dizer, mas eu digo e repito que só de estar lá, oferecer o ombro, uma companhia, já é uma forma de cuidado muito boa.”⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀

Encontrar pessoas que a fazem refletir sobre seu lugar privilegiado ajuda na empatia. “Tem uma canção que a gente canta em protestos que é assim: ‘companheira me ajude, que eu não posso andar só. Sozinha ando bem, mas com você ando melhor’. Se a gente se preocupa e ajuda uma pessoa que está na nossa frente em alguma situação de risco, então eu sinto que estou fazendo minha parte. Acho ótimo que está se pensando mais em #autocuidado, mas acho uma pena ser comercializado, porque a tendência de se mercantilizar é encarecer algo que é tão essencial.”

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Para @indominus.rita#autocuidado é uma tentativa diária, feita em baby steps. Ela ainda derrapa na questão trabalho/dinheiro, se pega trocando o dia pela noite, trabalhando 3 dias sem dormir, se alimentando mal, se envolvendo em assuntos que são gatilhos mentais horríveis. “Mas em compensação me permito ter um final de semana sem trabalho, me permito assistir um filme ou uma série no final de um dia de trabalho, se adoeço me permito o descanso, algo que a uns meses atrás eu jamais faria.”
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Rindo, ela conta que desiste o tempo todo, mas sempre acaba retomando as lutas porque acredita e quer mudança, igualdade, justiça. “Não vou deixar de ser negra, mulher, gorda, bissexual, é inaceitável que me tratem como um ser de segunda categoria, é inaceitável que eu me veja como um ser de segunda categoria. Vou brigar até o fim dos meus dias com as ferramentas que eu tiver para que nem eu nem ninguém seja tratado, visto ou se veja como alguém de segunda categoria.”
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Programadora e desenvolvedora, ela tem blog desde o começo da internet. Também já fez gestão de blogs coletivos, nos quais questões como sexualidade e racismo vinham à tona. Era forte e importante e, ao mesmo tempo, pesado. “O coletivo me fragilizou, precisei passar um tempo só pra poder me entender, me curar. Falamos muito sobre cuidarmos umas das outras, mas se não colocamos isso no foco dos nossos debates, a luta acaba passando por cima da gente, é complicado conseguir olhar pra alguém com gentileza quando a gente precisa embrutecer todo dia.”
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Ela traz uma questão importante, sobre o autocuidado como mercadoria. “Nem sempre é possível pagar pelo autocuidado, pra muitas de nós não é o nem sempre, é não podemos pagar mesmo. Mas a gente não precisa pagar pra tirar um tempo pra gente, pra um olhar mais gentil sobre as nossas necessidades.”
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Pra encerrar, cita Audre Lorde. “Cuidar de mim mesma não é auto-indulgência, é autopreservação, e isso é um ato político.” #jornadadeautocuidado

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Autocuidado é um termo muito amplo e a noção dele é muito subjetiva, aponta a psicóloga @luizacravo. “Não é porque ela é ampla que é superficial ou deixa de ser importante. É algo que tem que tá permeando a nossa vida sempre. Você tem que se escutar pra entender o que é autocuidado pra você.”
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Um entrave para entender como o #autocuidado pode entrar na vida é que compramos essa ideia de que temos que produzir o tempo inteiro. “Acho super útil você ter um dia no qual desacelera, faz o que gosta, olha pra dentro, pro corpo. Mas para o cidadão médio isso não entra no conceito do que é válido. A maior parte das pessoas que se queixam de cansaço, exaustão, falta de energia e motivação são pessoas que de fato acabam desprendendo muita energia seja no trabalho, no cuidado da família, na pós-graduação, nesses lugares que a sociedade vai apontando onde devemos investir. Você sente que está sugado, e está mesmo. Você tá dando tudo o que você tem. Mas não são as únicas coisas a serem olhadas. Há toda a outra parte da vida, toda a potência que fica esquecida.”
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Talvez por isso tanta gente tenha resistência contra terapia e análise, como se fosse algo que só pessoas malucas ou muito problemáticas precisassem. “É difícil entrar em contato com certos conteúdos, às vezes vai por essa via mesmo, de não acreditar que necessidades afetivas e emocionais, ou até sinais que o próprio corpo dá, são importantes o suficiente para serem cuidados.” ⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀
Terapia e análise são indispensáveis para lidar com caos emocional. “Essa coisa de não tenho grana/não posso fazer terapia não existe. Existem lugares que oferecem de graça, preço simbólico, baseado no que você ganha. Quem quer fazer pode fazer. Um profissional não resolve sua vida por você, ele te ajuda a traduzir coisas que talvez seja difícil você por si só dar nome e compreender.”

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Quando a gente fala de mulheres e #autocuidado, precisamos lembrar do óbvio: somos todas muito diferentes. “Depende de você mora no campo ou na cidade, da sua classe social, da sua idade, da sua escolaridade. Você tem uma série de especificidades que vão dar uma perspectiva do que é autocuidado para você. Eu não diria que tem uma diferença entre mulheres brancas e negras. Acho que as diferenças são muitas, a depender de que lugar específico você ocupa nessa sociedade”, diz Bianca Santana (@biancasantanadelua), socióloga.
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Em comum, talvez, esteja essa percepção de exaustão que parece nos acometer. “Isso é uma cama, mas acho que a principal é a desconexão profunda com quem nós somos”, aponta Bianca. “As nossas dores, feridas, histórias são silenciadas. Parece que é uma vida nas aparências, como se a gente não conseguisse se conectar profundamente nem com a gente nem com as outras pessoas.”
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Falando especialmente sobre o Brasil, ela cita uma violência estruturante de um passado colonial e escravista. “A gente não conseguiu transformar, rever, curar. Isso nos leva para lugares de muita superficialidade. Como se abaixo tivesse um lodo, uma lama profunda, difícil. Então a gente fica ali na superfície, mas gasta muita energia manter aquela lama embaixo.” O momento do Brasil reflete negativamente. “Há uma sensação de insegurança e impotência. Pra mim, especialmente, o assassinato da Marielle Franco foi devastador. Tem uma mensagem muito explícita, de que não é para mulheres negras ocuparem determinados lugares.”
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Uma solução? Cuidar de si antes de tentar cuidar do outro. Lembrando sempre que autocuidado não precisa ser mercadoria. “Lembro da minha avó, uma mulher negra, empregada doméstica, pobre, que todo dia aguava as próprias plantas, conversava, tinha uma relação linda com as ervas, fazia ‘lichás’ pra si, pras pessoas ao redor. Não tinha a ver com mercadoria, dinheiro, e sim com saber ancestral. Acessar nossa memória, compartilhar nossos saberes, acessar algo que pertença a todas as pessoas pode ser anticapitalista.”

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